A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA) estará no Ceará nesta sexta-feira (17) para inspecionar as unidades socioeducativas que foram alvo de medidas cautelares em 2015. Representantes da comissão irão visitar o Centro Educacional São Miguel e o Centro Educacional Dom Bosco, nos bairros Passaré e Bonsucesso, respectivamente.
A visita de inspeção ocorre na semana em que quatro adolescentes internos no Centro de Semiliberdade Mártir Francisca, no Bairro Sapiranga, foram retirados à força da unidade e assassinados a tiros em uma rua, na última segunda-feira (13). O centro ficará fechado por decisão da Justiça até que seja aprovado um plano que garanta a segurança dos internos.
A agenda da OEA envolve visitas de inspeção às duas unidades; reunião com os peticionários Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (Cedeca Ceará), Fórum Permanente de ONGs de Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes (Fórum DCA) e demais organizações da sociedade civil; reunião com Governo do Estado, Secretaria de Justiça e Superintendência Estadual do Sistema Socioeducativo; reunião com o Tribunal de Justiça, além de conselhos de direito e parlamento.
Nesta segunda-feira (13), um relatório conjunto do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) foi entregue em Brasília aos comissários da CIDH/OEA.
No documento, publicado nesta quinta-feira (16), o CNDH afirma que as medidas cautelares autorizadas pela CIDH não foram implementadas pelo Governo do Estado. O órgão internacional recomenda que o Ministério Público do Ceará adote medidas cabíveis contra o Governador do estado; represente contra o Superintendente Estadual de Atendimento Socioeducativo por improbidade administrativa e apure os inquéritos sobre homicídios de adolescentes nas unidades.
Além do relatório do CNDH, o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (Cedeca) esteve em Brasília e disponibilizou para os comissários um relatório sobre as principais violações de direitos humanos no Sistema Socioeducativo cearense. O órgão também denunciou a chacina do Centro de Semiliberdade Mártir Francisca.
Relatório do CNDH
O documento do CNDH concluiu que persistem "graves violações de direitos humanos nas unidades de internação do Ceará, como por exemplo, a ausência de oferta educativa regular para os adolescentes, o emprego de revista vexatória e de algemas de maneira abusiva, além de longo tempo de confinamento de adolescentes, que chegam a ficar 23 horas e 45 minutos por dia encarcerados, em dormitórios com estrutura de cela".
Também foram identificados um grande número de denúncias de violência institucional sem a devida apuração e atraso processual na vara responsável pela execução das medidas socioeducativas, mantendo os adolescentes detidos por mais tempo do que o determinado.
Foram realizadas audiências com representantes do Sistema de Justiça e do Executivo local, reuniões com movimentos e organizações locais e visitou três unidades de internação: Centro Educacional Dom Bosco, Centro Educacional São Miguel e Centro Educacional Patativa do Assaré.
Recomendações
O relatório também recomenda que o MPE-CE instaure procedimentos investigatórios sobre as denúncias de tortura e maus tratos sofridos pelos adolescentes nas unidades e no exercício do controle externo da atividade policial.
São feitas, ainda, recomendações relacionadas ao acesso à justiça e à atuação do Sistema de Justiça Juvenil; à estrutura e arquitetura das unidades; às visitas de familiares e visitas íntimas; ao direito à educação, à alimentação adequada, à integridade física, psicológica e à dignidade dos adolescentes internados, como por exemplo, que sejam abolidas a revista vexatória praticada contra adolescentes internos e seus familiares durante a realização das visitas ou de outras atividades externas aos dormitórios nas unidades, e a a utilização de isolamento compulsório como sanção disciplinar (“tranca”).
O relatório também propõe que o tempo de permanência dos adolescentes nos dormitórios seja adequado ao que estabelece o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), “com oferta de atividades educacionais, profissionalizantes, de lazer e de cultura, abolindo a prática de confinamento verificada nas unidades socioeducativas que chega a ser superior a 23 horas”.