
Crise faz crescer número de vendedores de quentinhas no Rio
A venda de quentinhas se tornou uma maneira para muitos moradores do Rio que foram impactados pela crise econômica driblarem a falta de dinheiro e o desemprego. Em apenas um ano, o comércio de refeições cresceu 463%, de acordo com o IBGE. No segundo trimestre de 2016 havia 7.992 vendedores de quentinhas pela cidade. Um ano depois, esse número subiu para 45 mil.
Os vendedores costumam chegar nos pontos por volta das 8h. A maioria das refeições é vendida por R$ 10 ou R$ 12. Muitas contam com uma bebida ou um docinho para a sobremesa como uma forma de conquistar a clientela.
“A sobremesa geralmente eu trago uma fruta ou, como hoje, que eu trouxe paçoca. Tem que saber ser um pouco agradável com as pessoas”, destacou o vendedor Gilberto Constantino.
O esforço dá certo. “É perfeita a comida dele: a feijoada e a bacalhoada é de arrebentar. E barata”, contou o motorista Fabrício Rodrigues, cliente fiel de Gilberto.
A aparência limpa também é um diferencial. Carla Ferreira investiu no isopor, que faz mais sucesso do que o alumínio, segundo ela. É uma maneira de tentar vencer a concorrência, que só aumenta.
“Oito anos atrás éramos três. Hoje tem mais de 21 pessoas vendendo”, revelou Carla.
Logo que chega ao local de venda, Gilberto Constantino escreve o cardápio. (Foto: Reprodução/ GloboNews)
Encontro com os consumidores
Um trecho do Aterro do Flamengo, na Zona Sul, se tornou praticamente uma praça de alimentação para os motoristas de aplicativos de transportes. Lá, eles comem e se reúnem com quem vende a comida.
“A quentinha aqui é muito prática. A gente pega aqui e, ainda que a gente não possa estacionar aqui, vamos para uma rua que possamos parar. A gente come, descansa um minuto e volta a trabalhar”, destacou o motorista Eduardo Fernando.
E tem também quem era motorista e resolveu usar o carro para a venda de comida. “Eu estou na média de 30 a 35 quentinhas. Por dia dá, mais ou menos, R$ 300. Dá para a gente sobreviver, a continha dá para pagar”, disse Leonardo Dias.
O ponto de Leonardo é um local da Lagoa Rodrigo de Freitas, também na Zona Sul, que tem um vendedor a cada 50 metros.
Leonardo Dias era motorista, mas largou o ofício para vender quentinhas. (Foto: Reprodução/ GloboNews)
Impacto nos restaurantes
O novo cenário já afeta os restaurantes. Em um deles, onde o movimento caiu mais da metade, o preço da refeição teve que ser reduzido para que os clientes fosse “resgatados”.
“Hoje eu vendo o prato a R$ 12. Daqui eu pago o aluguel, seis funcionários, pago impostos, que não são pequenos. E se a casa fechar, são seis funcionários que vão ficar desempregados”, frisou Pedro Fidalgo, dono de restaurante.
Por outro lado, o comércio de embalagens está aquecido. A comerciante conta que sempre chega alguém para comprar e começar a vender quentinhas.
“A pessoa fica desempregada e vai se aventurar a vender comida porque sabe que todo mundo tem que comer. Às vezes é o empregado de um restaurante que fecha e manda embora. Aí ele começa a trabalhar por conta própria, vai vender na rua, em pontos de táxi, nesses lugares assim”, explicou Luzineia Cabral.
Informalidade
O fenômeno na venda de quentinhas não é só de terras fluminenses.
“Não é só no Rio, mas em outros estados isso também está acontecendo e a pesquisa mostra isso, é o aumento das pessoas comercializando comida. Você me pergunta: essas pessoas podem estar gerando também emprego? Sim, mas é um emprego sem carteira”, explicou Cimar Azeredo, do IBGE.
Para o pesquisador, o aumento na venda de quentinhas pode ser uma oportunidade, mas não por muito tempo.
“Isso é uma saída em um primeiro momento, em uma recuperação de crise, isso pode ser uma resposta. O que não pode é isso durar muito tempo, porque a gente sabe das dificuldades e dos problemas que a informalidade traz não só para a pessoa, mas também para o país”, destacou o especialista.
A vendedora Simone Oliveira teve que contratar um time para trabalhar com ela. Não era mais possível atender o tamanho da clientela. Ela lidera um time de vendedores de mais de 100 quentinhas por dia.
“Eu comecei em casa, aí tive que abrir uma loja, alugar uma loja, com um fogão industrial, tem uma equipe. Está indo bem, graças a Deus”, destacou Simone.